Sinopse

O romance de Maria Lúcia e João Alfredo e a trajetória de um grupo de colegas do tradicional Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, desde o ano de 1964, quando se forma e se instala no país a Ditadura Militar – com prisão, tortura, assassinato e extradição dos opositores -, até 1979, ano da anistia dos exilados, em que a política governamental terá influenciado definitivamente os destinos dos personagens.

Maria Lúcia é uma jovem individualista, traumatizada com a história do pai, Orlando Damasceno, um conhecido jornalista e membro do Partido Comunista que sempre colocou a ideologia acima da realização pessoal. Quando ela conhece João Alfredo, percebe que ele tem o mesmo perfil do pai e tem medo de se entregar à paixão. João, por sua vez, é um rapaz extremamente preocupado com as questões sociais do país.

Ao se apaixonar por Maria Lúcia, João Alfredo fica dividido entre o relacionamento afetivo e a militância política. Seu melhor amigo, Edgar, também se apaixona por ela e os dois passam a disputar o amor da jovem. Com perfil oposto ao do amigo, Edgar não se envolve com as questões políticas e prefere investir na profissão e na felicidade pessoal.

Apesar de se amarem, Maria Lúcia e João Alfredo vivem em conflito por causa da ideologia dele. O namoro fica ainda mais difícil quando ele decide entrar para a luta armada. Após muitos encontros e desencontros, os dois acabam se separando definitivamente. Ela se casa com Edgar, e João, perseguido pela ditadura, é obrigado a sair do país.

Entre os companheiros do movimento contra o regime está Heloísa, filha do banqueiro Fábio Brito, que ajudou a financiar o Golpe de 1964. De garota rica e mimada, Heloísa dá uma guinada em sua vida ao entrar para a luta armada. O auge é o sequestro de um diplomata estrangeiro pelos guerrilheiros e, posteriormente, a sua morte por um policial militar em uma tentativa de fuga do país.

Globo – 22h30
de 14 de julho a 14 de agosto de 1992
20 capítulos

minissérie de Gilberto Braga
inspirada nos livros “1968, O Ano Que Não Acabou”, de Zuenir Ventura, “O Que É Isso, Companheiro?”, de Fernando Gabeira, e “Os Carbonários”, de Alfredo Sirkis
escrita por Gilberto Braga e Sérgio Marques
colaboração de Ricardo Linhares e Ângela Carneiro
direção de Dennis Carvalho, Sílvio Tendler e Ivan Zettel
direção geral de Dennis Carvalho

CÁSSIO GABUS MENDES – João Alfredo Galvão
MALU MADER – Maria Lúcia Damasceno
CLÁUDIA ABREU – Heloísa Brito
MARCELO SERRADO – Edgar Ribeiro
PEDRO CARDOSO – Galeno Quintanilha
JOSÉ WILKER – Fábio Brito
BETTY LAGO – Natália Brito
KADU MOLITERNO – Professor Inácio Avelar
GERALDO DEL REY – Orlando Damasceno
BETE MENDES – Carmem Damasceno
IVAN CÂNDIDO – Aberlardo Galvão
NORMA BLUM – Valquíria Galvão
GIANFRANCESCO GUARNIERI – Dr. Salviano
DEBORAH EVELYN – Sandra
RUBENS CARIBÉ – Marcelo
MILA MOREIRA – Regina
CARLOS ZARA – Queiróz
MARIA LÚCIA DAHL – Yone
ANDRÉ PIMENTEL – Valdir
TUCA ANDRADA – Ubaldo
MARCELLO NOVAES – Olavo
ANDRÉ BARROS – Bernardo
PAULA NEWLANDS – Lavínia
MAURÍCIO FERRAZA – Gustavo
MALU GALLI – Jurema
THALES PAN CHACON – Nelson
DENISE DEL VECCHIO – Dolores
GEÓRGIA GOMIDE – Zuleica
TEREZINHA SODRÉ – Adelaide
SÔNIA CLARA – Glória
ROBERTO PIRILO – Capitão Rangel
FÁTIMA FREIRE – Idalina
FRANCISCO MILANI – Inspetor Camargo
ODILON WAGNER – Ralf Haguenauer
CASTRO GONZAGA – Teobaldo
LOURDES MAYER – Marta
STEPAN NERCESSIAN – Caramuru
STELA FREITAS – Dagmar
YAÇANÃ MARTINS – Kira
SILVIA SALGADO – Solange
BENVINDO SIQUEIRA – Xavier
MARIA RITA – Zilá
ZENI PEREIRA – Talita
NILDO PARENTE – Pedro Paulo
CARLOS GREGÓRIO – Alberto
ENRIQUE DIAZ – Pedro
ÉLIDA L´ASTORINA – Ângela
EMÍLIO DE MELLO – Toledo
EDYR DE CASTRO – Zulmira
JONATHAN NOGUEIRA – Guilherme
LEANDRO FIGUEIREDO – José Rodolfo
BERNARDO JABLONSKI – Juarez
MARJORIE ANDRADE – Maria Isabel Soares
CARLA JARDIM – Jaqueline

e
ADRIANA DE BROOKS – repórter
CININHA DE PAULA – Dona Mariléia (censora que avalia uma novela de Galeno)
CLARA CRESTA – Leila (filha de Dagmar)
EMILIANO QUEIRÓZ – Dr. Acir (médico cardiologista que indicou a cirurgia coronária de Damasceno)
EVA WILMA – Joana (atriz)
FAUSTO GALVÃO – Michael (amigo de Galeno)
HÉLIO ZACCHI – Fausto
HERSON CAPRI – comandante
JORGE COUTINHO – Pai Betão (vizinho do cativeiro onde está o embaixador sequestrado)
JOYCE DE OLIVEIRA – Dona Marli
MALU VALLE – Célia (professora do Colégio Pedro II)
MARIA PADILHA – Maria Satamini (atriz)
MÁRIO CARDOSO – Capitão Junqueira
MOACYR DERIQUÉM – diretor de teatro
NELSON MOTTA – repórter no Festival da Canção
PAMELA ORLANDO E SOUZA – Maria Clara
PATRÍCIA NOVAES – Vera (amante de Fábio no início)
PAULO CARVALHO – Sérgio (secretário de Fábio)
PAULO FIGUEIREDO – Delegado Belloti
PAULO MENDES – Madureira
SIMON KHOURY – Antunes
SUSANA VIEIRA – Mariana (advogada, amiga de Regina, agredida por um agente da repressão durante um depoimento)

– núcleo de JOÃO ALFREDO (Cássio Gabus Mendes), jovem que se engaja na luta armada contra a ditadura:
os pais ABELARDO GALVÃO (Ivan Cândido) e VALQUÍRIA (Norma Blum)
os irmãos JOSÉ RODOLFO (Leandro Figueiredo) e GUILHERME (Jonathan Nogueira)
a empregada TALITA (Zeni Pereira).

– núcleo de MARIA LÚCIA (Malu Mader), que se apaixona por João Alfredo, apesar dos dois serem muito diferentes em suas convicções:
os pais ORLANDO DAMASCENO (Geraldo Del Rey), jornalista dado a expedientes políticos, e CARMEM (Bete Mendes)
os avós TEOBALDO (Castro Gonzaga) e MARTA (Lourdes Mayer), pais de Damasceno
a tia DOLORES (Denise Del Vecchio), irmã de Carmem
a empregada DAGMAR (Stella Freitas) e sua filha pequena LEILA (Clara Cresta)
o porteiro do prédio onde moram CARAMURU (Stepan Nercessian).

– núcleo de HELOÍSA (Cláudia Abreu), moça de temperamento rebelde, a princípio fútil e alienada mas que muda completamente ao entrar para a luta armada:
os pais FÁBIO BRITO (José Wilker), banqueiro, um dos financiadores do golpe de 1964, e NATÁLIA (Betty Lago), mulher infeliz no casamento
o irmão BERNARDO (André Barros)
o almofadinha OLAVO (Marcello Novaes), apaixonado por ela e com quem acaba se casando só para poder sair de casa
o professor de violão NELSON (Thales Pan Chacon), que ela espera que lhe tire a virgindade
a amiga de Natália, SOLANGE (Sílvia Salgado)
o advogado de Natália, TOLEDO (Emílio de Mello)
o secretário de Fábio, SÉRGIO (Paulo Carvalho)
a ex-babá de Heloísa, ZULMIRA (Edyr de Castro).

– núcleo de EDGAR (Marcelo Serrado), melhor amigo de João Alfredo, apaixonado por Maria Lúcia com quem acaba se casando:
a mãe REGINA RIBEIRO (Mila Moreira), advogada.

– núcleo do DR. SALVIANO (Gianfrancesco Guarnieri), médico que luta contra a ditadura e que leva João Alfredo e Heloísa para a luta armada:
a filha SANDRA (Deborah Evelyn), também engajada na luta armada
os demais integrantes do grupo que luta contra a ditadura: MARCELO (Rubens Caribé), PEDRO (Enrique Diaz) e
ALBERTO (Carlos Gregório)
o embaixador suíço RALF HAGUENAUER (Odilon Wagner), seqüestrado pelo grupo
a garota JAQUELINE, vizinha da casa onde o grupo está instalado.

– núcleo do PROFESSOR INÁCIO AVELAR (Kadu Moliterno), visado pela repressão e com quem Natália se envolve:
o amigo com quem divide o apartamento, o fotógrafo jornalista UBALDO (Tuca Andrada)
a atriz ÂNGELA (Élida L’Astorina), namorada de Ubaldo
o professor JUAREZ (Bernardo Jablonski), divide o apartamento com Avelar e Ubaldo, sai do país no início da história, perseguido pela repressão.

– núcleo de QUEIRÓZ (Carlos Zara), dono da Editora Tebas, onde Maria Lúcia e Edgar vão trabalhar. Afundado em dívidas, ele perde sua editora para o grupo financeiro de Fábio, que elege Edgar o novo diretor geral:
a mulher YONE (Maria Lúcia Dahl)
a filha LAVÍNIA (Paula Newlands), amiga de Maria Lúcia
o jovem médico GUSTAVO (Maurício Ferraza), que casa-se com Lavínia
a secretária da editora, KIRA (Yaçanã Martins).

– núcleo de GALENO QUINTANILHA (Pedro Cardoso), apaixonado por cinema e teatro, amigo de João Alfredo e Edgar:
a irmã, IDALINA (Fátima Freire), com quem mora a princípio
o cunhado militar, CAPITÃO RANGEL (Roberto Pirilo), marido de Idalina
o amigo do teatro MICHAEL (Fausto Galvão).

– núcleo de VALDIR (André Pimentel), amigo de João Alfredo, Edgar e Galeno. Vai trabalhar no banco de Fábio e vira seu capacho:
os pais, gente muito simples, XAVIER (Benvindo Siqueira), porteiro do prédio de João no início e que depois vira caseiro de Queiróz em Petrópolis, e ZILÁ (Maria Rita).

– núcleo das fofoqueiras, amigas de Dolores:
ZULEICA (Geórgia Gomide)
ADELAIDE (Terezinha Sodré)
GLÓRIA (Sônia Clara).

– demais personagens:
a amiga de Maria Lúcia, JUREMA (Maria Luiza Galli)
o amigo de Damasceno e Salviano, PEDRO PAULO (Nildo Parente)
os funcionários da repressão CAMARGO (Francisco Milani) e JUNQUEIRA (Mário Cardoso)
o delegado BELLOTTI (Paulo Figueiredo)
o comandante amigo de Fábio, (Herson Capri).

Abordagem

Memorável momento da televisão. O fascínio maior estava em trazer de volta os anos 1960. No entanto, a importância da minissérie está mesmo em revelar ao país a obscuridade dessa década no Brasil, sem ser didática nem formadora de opinião. A luta armada de alguns era narrada junto ao cotidiano daqueles que viveram essa época em total alienação. (“Memória da Telenovela Brasileira”, Ismael Fernandes)

Tendo como pano de fundo o romance de João Alfredo (Cássio Gabus Mendes) e Maria Lúcia (Malu Mader), a história levou ao público a luta clandestina de grupos engajados politicamente na tentativa de mudar a história do país. Os relatos mesclaram ficção e realidade por meio do ideal de vida de João Alfredo, jovem preocupado com as questões sociais, capaz de colocar a militância política acima de sua felicidade e realização pessoal.

Por altura da estreia, o diretor Dennis Carvalho afirmou:
“Não é apenas mais uma simples série, é uma coisa que transcende. Topei o projeto porque percebi a sua importante conotação com o atual momento nacional. Nesses anos rebeldes, o país estava em ebulição, como está agora.”

Anos Rebeldes foi premiada pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA) com o Grande Prêmio da Crítica e com o prêmio de melhor atriz, para Cláudia Abreu, em 1992.

Caras pintadas

Não deixa de ser irônico que Anos Rebeldes tenha surgido justamente quando o primeiro presidente da República eleito por voto direto após 29 anos – Fernando Collor de Mello -, que deveria ser o corolário natural do processo de democratização do país, tenha se transformado na decepção de milhares de brasileiros.

Em uma atitude inspirada no idealismo do personagem João Alfredo (Cássio Gabus Mendes), os jovens brasileiros foram às ruas exigir o impeachment do presidente Collor, rejeitando o rótulo de alienados – movimento que ficou conhecido em 1992 como “Caras Pintadas”.

Os protestos exibiam cartazes com frases do tipo “Anos Rebeldes, próximo capítulo: Fora Collor! Impeachment já!” e eram embalados por canções como “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, tema de abertura da minissérie.

Na sexta-feira de 14 de agosto de 1992, dia do último capítulo, Collor falou em rede nacional de rádio e TV convocando a população a se manifestar no domingo seguinte, 16 de agosto, em seu apoio, indo para as ruas vestindo verde-e-amarelo. Como resposta à convocação, o 16 de agosto de 1992 ficou conhecido como “domingo negro”. As pessoas foram às ruas, mas com roupas negras e rostos marcados de tinta preta, simbolizando o luto e a indignação que sentiam com o governo.

O presidente acabou afastado do cargo em 29 de setembro, em meio às denúncias e pressão cada vez maior das manifestações nas ruas. O processo de impeachment, antes de aprovado, fez com que Collor renunciasse em 29 de dezembro de 1992, deixando o cargo para seu vice Itamar Franco. Mesmo assim, o processo continuou. Com o julgamento, Collor ficou inelegível por 8 anos.

Muitos apontaram Anos Rebeldes como inspiradora das manifestações, porém, os autores constataram ter havido uma sintonia positiva, uma coincidência que fez tudo acontecer ao mesmo tempo. (*)

Trilogia

Para escrever Anos Rebeldes, Gilberto Braga acatou uma sugestão dada pelo próprio público, que queria a continuação da minissérie Anos Dourados (de 1986), sugerindo inclusive o nome da série. (*)
Também foi sugerida ao autor uma terceira parte, para fechar uma trilogia, que nunca aconteceu.

Para o jornal Folha de São Paulo (de 14/07/1992), Gilberto explicou a diferença entre as duas minisséries: Anos Dourados é uma história contra a hipocrisia. Anos Rebeldes é contra o autoritarismo e a intolerância, exemplificados pela ditadura militar.”

Inspiração

Gilberto Braga narrou ao livro “Autores, Histórias da Teledramaturgia”, do Projeto Memória Globo, que não se sentia apto a abordar o tema sozinho e buscou colaboração:
“Eu era muito alienado nos anos 1960. Não sabia nada do que estava acontecendo, não me interessava por política. (…) Para escrever Anos Rebeldes, fui atrás de um escritor que tinha feito política estudantil e conhecia muito bem o período, meu amigo Sérgio Marques, que me ensinou tudo. Eu não seria capaz de fazer sozinho. Estudei muito, li um monte de livros. (…) Daquele período, o que eu conhecia mesmo eram as peruas da praia que ficavam falando besteira.”

Em Anos Rebeldes, o autor reproduziu – com licenças poéticas e nomes trocados, naturalmente – a história verídica do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick, em setembro de 1969, por integrantes dos grupos guerrilheiros de esquerda que lutavam contra o Regime Militar. Na trama da minissérie, entre os guerrilheiros estavam João Alfredo (Cássio Gabus Mendes) e Heloísa (Cláudia Abreu), e o diplomata estrangeiro raptado recebeu o nome de Ralf Haguenauer, vivido por Odilon Wagner.
O caso real foi reproduzido no livro “O Que É Isso, Companheiro?”, de Fernando Gabeira, de 1979, e levado ao cinema em 1997, no filme de Bruno Barreto (indicado ao Óscar, em 1998) homônimo ao livro. Cláudia Abreu e Pedro Cardoso, do elenco da minissérie, também participaram do filme.

Além do livro “O Que É Isso, Companheiro?”, de Fernando Gabeira, Gilberto Braga buscou inspiração em outras duas publicações: “1968, O Ano Que Não Acabou”, de Zuenir Ventura, e “Os Carbonários”, de Alfredo Sirkis.

Outra inspiração para o autor foi o cinema: os filmes Desaparecido, um Grande Mistério (1982), de Costa-Gavras, e Nosso Amor de Ontem (1973), de Sidney Pollack.

O primeiro título pensado para a minissérie foi Anos de Chumbo. (“Almanaque da TV”, Bia Braune e Rixa)

Gilberto Braga narrou na minissérie uma passagem acontecida consigo na época em que escrevia a novela Escrava Isaura (1976-1977). O personagem Galeno Quintanilha (Pedro Cardoso) era um novelista que escrevia uma trama de cunho abolicionista, nos anos 1970, e foi repreendido por uma censora em uma reunião em Brasília. Gilberto de fato passou por essa situação e aproveitou a minissérie para mostrar as dificuldades pelas quais passavam os novelistas com a censura do Governo Federal durante os Anos de Chumbo.

Revisionismo

Em 17/07/1992, três dias depois da estreia de Anos Rebeldes, os militares soltaram uma nota com o título “A história que não foi contada”. Ainda que não fizesse qualquer referência ao nome da minissérie, o texto do Centro de Comunicação Social do Exército criticava os “revisionistas de plantão” e defendia a “Revolução Democrática de 1964” como um “movimento que, cumpre enfatizar, foi deflagrado pelo clamor popular”. De acordo com as Forças Armadas, tais momentos vinham sendo “reescritos segundo ótica deturpada, porquanto tendenciosa”.

Em seu livro “Anos Rebeldes, os Bastidores da Criação de uma Minissérie”, Gilberto Braga escreveu a respeito das reclamações do Exército.
“Embora não seja panfletário, tende nitidamente para o lado da antiga esquerda, ou seja, contamos uma história a partir do ponto de vista dos esquerdistas, e não me envergonho disso. Era a primeira vez que uma emissora de TV se dispunha a levar ao ar, na dramaturgia, uma abordagem séria sobre a ditadura militar brasileira. Não seria eu a dar a versão da direita, que até hoje chama o golpe de ‘revolução’.”

O jornalista Zuenir Ventura cobriu de elogios a minissérie. Segundo ele:
“Gilberto Braga consegue devolver o valor essencial daquele momento, que é a paixão. E acho que a grande atualidade da série, principalmente para os políticos, é mostrar que a política pode ser ética.”

Menos entusiasta, o deputado Alfredo Sirkis – que muitos afirmaram ser o modelo que inspirou o personagem João Alfredo – preocupou-se com a censura vigente na Globo:
“Sei que Anos Rebeldes não é uma obra política, mas uma história de amor ambientada nos Anos de Chumbo. Só que este pano de fundo tem que ser honesto. Não se pode atenuar o terror que foi aquela época, em termos de repressão e cerceamento da liberdade.”

Erro de continuidade

Heloísa – em um brilhante trabalho da atriz Cláudia Abreu – é uma das personagens mais marcantes e lembradas da minissérie: garota rica, rebelde e um tanto individualista que passa por uma transformação até adquirir consciência política sobre o momento em que vivia. Engajada, acaba entrando para a luta armada. Uma das melhores cenas de Anos Rebeldes foi a morte da personagem, a tiros de metralhadora, por um policial, ao tentar fugir do país.

Nesta sequência, ocorreu um notório erro de continuidade. Na cena, o carro em que Heloísa estava, é parado por um policial e ela sai do automóvel, com uma bolsa a tiracolo, enquanto os demais ocupantes do carro permanecem dentro do veículo. Colocando a mão na bolsa, o policial pensa que ela vai sacar uma arma e atira nela. Quando é atingida, Heloísa joga a bolsa longe, enquanto o carro sai em disparada. Em uma tomada posterior, quando o inspetor Camargo (Francisco Milani) se aproxima da vítima, a bolsa está junto ao seu corpo, e não longe, como na cena anterior. É quando ele percebe que Heloísa tirava a carteira de identidade da bolsa, e não uma arma.

Elenco

Destaque para as ótimas interpretações do trio de atores protagonistas: Malu Mader, Cássio Gabus Mendes e Cláudia Abreu.

Quando Kadu Moliterno foi convidado para fazer Anos Rebeldes, seria Nelson, o professor de violão de Heloísa por ela escolhido para perder a virgindade. Porém, Marcos Paulo, que faria o professor de História Inácio Avelar, não pôde fazer, acabando Kadu com o papel. Para compor o visual do personagem, pela primeira vez o ator deixou crescer barba. Para o professor de violão, foi convocado o ator Thales Pan Chacon.

Gilberto Braga inspirou-se na diretora teatral Tetê Medina para compôr Avelar. Na época, ela era funcionária do Itamaraty, mas engajada na luta, como o personagem da minissérie. No entanto, ela nega que, como ele, tenha utilizado o telex ou a mala diplomática da chancelaria brasileira para denunciar aos jornais europeus crimes cometidos contra presos políticos.
“Eu não era louca para mandar denúncias pela mala diplomática”, disse Tetê. “Elas eram enviadas mesmo, mas por outros meios.”

O editor Queiroz (Carlos Zara), e mais propriamente a sua luta contra o Regime Militar, foi inspirado em Ênio Silveira do grupo editorial Civilização Brasileira.

Militantes de esquerda, os atores Bete Mendes, Francisco Milani e Gianfrancesco Guarnieri, do elenco, passaram pelas prisões da Ditadura. Ex-integrante da organização VAR-Palmares, Bete Mendes deu um depoimento ao elenco sobre sua militância política na época.

Estreia de Betty Lago na televisão, como atriz. Também o primeiro trabalho em TV dos atores Emílio de Mello, Malu Galli, Rubens Caribé e André Barros.

Os nomes do casal protagonista homenageavam os pais do cantor Cazuza: Maria Lúcia e João Araújo.

Painéis documentais

Os painéis documentais em preto e branco, filmados em película de 16mm, exibidos ao longo da trama, foram feitos pelo cineasta Silvio Tendler, constituídos por uma extensa pesquisa em imagens de época, fotografias e recortes de jornais, que se misturavam a cenas da minissérie gravadas em preto e branco. (*)

Nestes painéis, acompanhados por músicas daquele momento, apareciam registros como a eleição de Emílio Garrastazu Médici (1905-1985) para a Presidência da República e a morte do líder da organização Ação Libertadora Nacional, Carlos Marighella (1911-1969).

Cenografia

A maior parte das cenas foi gravada em estúdio. Foram feitas reconstituições de época do Teatro Opinião e da porta do cinema Paissandu, que ficaram a cargo do cenógrafo Mário Monteiro, com ajuda da produtora de arte Cristina Médicis. (*)

Trilha sonora

A trilha sonora de Anos Rebeldes, uma das melhores já feitas, teve coordenação musical do próprio Gilberto Braga. Foram selecionadas músicas representativas do período retratado na trama, nacionais e internacionais, misturando pop com bossa nova e tropicalismo.

É a terceira mais vendida entre as trilhas de séries e minisséries da Globo, 126.130 cópias, perdendo apenas para as trilhas de Malu Mulher (2º lugar) e Anos Dourados (1º lugar).

A música-tema de abertura, “Alegria Alegria”, de Caetano Veloso, já havia sido usada na abertura da novela Sem Lenço Sem Documento, em 1977.

Repetecos

Em julho de 1992, durante a exibição da minissérie, seu texto foi lançado em livro, com adaptação de Flávio de Campos, pela Editora Globo.
Em junho de 2010, Gilberto Braga lançou o roteiro completo da minissérie no livro “Anos Rebeldes – Os Bastidores da Criação de Uma Minissérie”, pela Editora Rocco.

Anos Rebeldes foi reapresentada de 7 a 31/03/1995, em 16 capítulos, nas comemorações dos 30 anos da TV Globo.
Também reprisada de 17 a 24/01/2005, no Multishow (canal de TV paga pertencente à Rede Globo), em comemoração aos 40 anos da emissora. O Multishow reapresentou a versão internacional de 6 capítulos, com todas as legendas de passagem de tempo em inglês.
Ainda pelo Viva (outro canal de TV paga pertencente à Globo), na íntegra, em duas ocasiões: entre 30/05 a 24/06/2011, às 23h45, e entre 27/05 e 21/06/2013, às 23h15.

Anos Rebeldes também foi lançada em vídeo, ainda nos anos 1990, e em DVD, em 2003.

(*) Site Memória Globo.

01. BABY – Gal Costa e Caetano Veloso (tema de Maria Lúcia)
02. SAPORE DI SALE – Gino Paoli
03. CARTA AO TOM – Toquinho e Vinícius
04. CAN’T TAKE MY EYES OFF YOU – Frankie Valley & The Four Seasons (tema de Maria Lúcia e João Alfredo)
05. MASCARADA – Emílio Santhiago (tema de Inácio e Natália)
06. ALEGRIA ALEGRIA – Caetano Veloso (tema de abertura)
07. GOING OUT OF MY HEAD – Sérgio Mendes (tema geral)
08. MONDAY MONDAY – The Mamas & The Papas
09. THERE’S A KIND OF HUSH – Herman’s Hermits
10. SOY LOCO POR TI AMERICA – Caetano Veloso
11. DISCUSSÃO – Silvinha Telles
12. CALL ME – Chris Montez (tema de Heloísa)
13. SENZA FINE – Ornella Vanoni (tema de Natália)
14. GUATANAMERA – Edom e Felipe
15. THE HOUSE OF THE RISING SUN – Edom e Felipe

Sonoplastia: Adirson Sansão
Coordenação musical: Gilberto Braga
Produção musical: Edom de Oliveira e Felipe Reis
Direção musical: Mariozinho Rocha

Ainda
A BANDA – Nara Leão
AQUARIUS / LET THE SUNSHINE IN – The 5th Dimension
ARRASTÃO – Elis Regina
BACHIANAS BRASILEIRAS Nº 4 (prelúdio) – Heitor Villa Lobos
COMO NOSSOS PAIS – Eis Regina
DANÚBIO AZUL – Johann Strauss II
GUARDA COME DONDOLO – Edoardo Vianello
I WANT TO HOLD YOUR HAND – The Beatles
MISSA AGRÁRIA / CARCARÁ – Maria Bethânia
O BÊBADO E A EQUILIBRISTA – Elis Regina
PATA PATA – Miriam Makeba
PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES – Geraldo Vandré
QUERO QUE VÁ TUDO PRO INFERNO – Roberto Carlos
RODA – Gilberto Gil
RODA VIVA – Chico Buarque
SÁ MARINA – Wilson Simonal
SABIÁ – Cynara e Cybele
(I CAN’T GET NO) SATISFACTION – The Rolling Stones
SUN KING – The Beatles

Tema de abertura: ALEGRIA ALEGRIA – Caetano Veloso

Caminhando contra o vento
Sem lenço, sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou

O sol se reparte em crimes
Espaçonaves, guerrilhas
Em cardinales bonitas
Eu vou

Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras
Bombas e Brigitte Bardot

O sol nas bancas de revistas
Me enche de alegria e preguiça
Quem lê tanta notícia?
Eu vou

Por entre fotos e nomes
Os olhos cheios de cores
O peito cheio de amores vãos
Eu vou
Por que não? Por que não?

Ela pensa em casamento
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço, sem documento
Eu vou

Eu tomo uma Coca-Cola
Ela pensa em casamento
E uma canção me consola
Eu vou

Por entre fotos e nomes
Sem livros e sem fuzil
Sem fome, sem telefone
No coração do Brasil

Ela nem sabe, até pensei
Em cantar na televisão
O sol é tão bonito

Sem lenço, sem documento
Nada no bolso ou nas mãos
Eu quero seguir vivendo
Amor eu vou
E por que não? Por que não? Por que não…

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